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A licença-paternidade e o desafio de não elevar ainda mais o Custo Brasil

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POR: Ana Paula De Raeffray e Franco Brugioni

 

O INCREMENTO DA LICENÇA-PATERNIDADE E O DESAFIO DE 
NÃO ELEVAR AINDA MAIS O CUSTO BRASIL

Por pressão legítima de entidades da sociedade civil organizada, a discussão sobre o aumento da licença-paternidade tem aumentado nos últimos anos. É difícil ser contra a ideia de que os pais possam participar mais ativamente do início da vida dos seus filhos, assumindo uma maior responsabilidade pelos seus cuidados.

A necessidade de regulamentação desse direito está prevista no art. 7º, inciso XIX, da Constituição Federal. Enquanto não regulamentado, define o artigo 10, § 1º, da ADCT que o prazo da licença-paternidade é de cinco dias.

Recentemente foi levada à apreciação do Supremo Tribunal Federal (STF) a omissão na regulamentação do art. 7º, inciso XIX, da Constituição. A conclusão foi no sentido de reconhecimento da omissão do Poder Legislativo, fixando-se o prazo de 18 meses para o Congresso Nacional sanar essa omissão. Caso não o faça, provavelmente o STF o fará, podendo estabelecer a equiparação entre os prazos das licenças maternidade e paternidade.

Há mais de cem projetos de lei versando atualmente sobre o tema no Congresso Nacional, mas um dos principais traz uma ampliação gradual do prazo da licença-paternidade, podendo chegar a até 60 dias[1], custeada pela previdência social.

É importante que se tenha consciência, entretanto, que com esse prazo de licença o Brasil passará a ter uma das maiores licenças-paternidades do mundo, ficando mais próximo de países como a Eslovênia e a Finlândia.

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Destoaremos, assim, da totalidade dos países da América Latina, em que a licença-paternidade está na média de cinco dias. Os que possuem prazo maior, que são Colômbia, Equador e Venezuela, oferecem licenças remuneradas de 8, 10 e 14 dias, respectivamente.

A razão pela qual esses países não adotam prazos maiores está ligada, sem dúvida, aos custos decorrentes e aos impactos sobre a competitividade das empresas. É impossível ignorar o “custo dos direitos”, para lembrar o título da famosa obra de Holmes e Sunstein, ainda mais em matéria de seguridade social.

Ora, foi para evitar que o Poder Público continuasse cedendo à pressão de grupos que pleiteiam direitos previdenciários os mais diversos que o Constituinte determinou que “nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total” (art. 195, § 5º, CF/88).

O caráter social da previdência social não sobrevive sem a observância do seu aspecto contributivo e a preservação do seu equilíbrio financeiro e atuarial, como as sucessivas reformas previdenciárias têm sinalizado e reforçado.

Em um momento em que ainda se discute a necessidade de redução da carga tributária das empresas por meio da Reforma Tributária e que já começam as notícias sobre a necessidade de uma nova Reforma Previdenciária, não vislumbramos como se avançar nesse debate como se fossem questões completamente dissociadas. Não são.

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Nesse mesmo sentido, se os custos da ampliação da licença-paternidade forem das empresas há de se considerar já o elevado custo da contratação formal no país. A decisão de eventual ampliação da licença deve ser realística, levando-se em conta a capacidade da Previdência e das empresas, de modo a não engrossar ainda mais o custo Brasil, com impactos na competitividade e na geração de empregos formais.

De toda forma, que o Congresso Nacional é quem possui as melhores condições de definir sobre essa alocação de custos e de direitos. Espera-se, assim, que o Poder Legislativo exerça de forma adequada essa prerrogativa dentro do prazo fixado pelo Supremo, sem se olvidar dos princípios e diretrizes que dão sustentação ao nosso já combalido sistema de seguridade social e a sustentabilidade das empresas.

Ana Paula De Raeffray é advogada, doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e sócia do escritório Raeffray Brugioni Sociedade de Advogados.

Franco Mauro Russo Brugioni – advogado, sócio do escritório Raeffray Brugioni Advogados. MBA em Gestão e Business Law pela Fundação Getúlio Vargas – FGV. Relator Vice-Presidente da Terceira Turma Disciplinar do Tribunal de Ética Disciplinar da Ordem dos Advogados do Brasil, Secção São Paulo.

 

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O maior poder da República

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Por: Laura Gandra e Guilherme Gandra

Imagine você, caro leitor, que estivesse estudando e se especializando para se tornar bacharel em direito. Ao longo do curso, você descobre a sua vocação para a advocacia e decide iniciar a sua jornada. Mesmo enfrentando um mercado bastante competitivo e saturado, em um país com mais de um (1) milhão de profissionais registrados, consegue se tornar qualificado, ganhar notoriedade e, com muito empenho e esforço, constrói um renomado escritório, tornando-se um dos maiores especialistas em crimes financeiros em todo o território nacional. No desenvolvimento da carreira, começa a ganhar influência e milhões de reais com as mais variadas causas, ganhando notabilid ade e conquistando aquilo que é o sonho da maioria das pessoas: prosperidade financeira. Diante deste cenário acima apresentado, faria sentido aceitar um emprego em que o salário é consideravelmente menor?

O panorama supracitado pode servir para explicar o percurso de Cristiano Zanin, advogado recém indicado à vaga preenchida no Supremo Tribunal Federal e que tomou posse do cargo no dia 03 de agosto. O questionamento foi levantado pelo jornalista Alexandre Garcia, em coluna publicada em jornal de circulação na região sul do país. A relevância de tal indagação merece reflexão. Quais são os benefícios que um advogado milionário, com honorários altíssimos, enxerga em um cargo no qual a remuneração será extremamente aquém daquilo que ele está acostumado a receber?

É importante destacar que não ousaremos analisar a exigência normativa do notório saber jurídico. O objetivo desta reflexão é entender o que seduziu Zanin e tantos outros a aceitar tal convite para ser ministro no STF.

Incialmente, lembramos que é evidente que se apresentar como guardião da Constituição, por si só, já é algo sedutor, mas o questionamento precisa permear o seguinte ponto: O que o texto constitucional carrega em sua forma para ampliar este atrativo?

No âmbito da teoria da Constituição, vários juristas conceituam o tema, como o jurista Celso Ribeiro Bastos que trouxe à tona diferentes conceitos da Lei Maior. Ao definir a Constituição em seu sentido formal, Bastos diz “que o texto constitucional abrange um conjunto de normas legislativas que se distinguem das não constitucionais em razão de serem produzidas por um processo formativo mais árduo e solene. A partir desse quórum especial, há a composição de uma estrutura que define os direitos fundamentais dos cidadãos, instituindo a maneira pela qual as coisas devem ser, e não descrever a real maneira de ser das co isas. A partir do sentido formal, evidencia-se a superioridade das normas constitucionais sobre as infraconstitucionais”.

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Por outro lado, há também o sentido material de Constituição, referente às normas constitutivas da sociedade, ou seja, trata-se de um texto que contém as forças de diferentes cunhos necessárias para informar as leis inferiores e instituições jurídicas que irão organizar o desenho do Estado. Esses aspectos, tradicionalmente, estão contidos na Constituição formal. Ocorre, no entanto, que nem sempre o conteúdo desta corresponde exatamente ao daquela. No caso brasileiro, o que se observa é que a Constituição Republicana excede os aspectos organizativos usualmente abordados neste tipo de documento, descendo aos pormenor es das relações jurídicas e da organização estatal. Se engana quem pensa que o acúmulo de processos no Supremo Tribunal Federal é a única consequência de tal configuração: pode-se observar, também, uma concentração desmedida de poderes e competências na mão dos representantes dessa Corte.

Naturalmente, a questão suscitada não implica apenas na necessidade de uma grande quantidade de papel para imprimir o documento maior. Observamos, na verdade, uma hipertrofia do poder do Supremo Tribunal

Federal. Esse fenômeno, constatado por estudiosos e analistas, possui reflexos práticos, como o crescente movimento de judicialização da política.

Engana-se quem pensa que era assim o projeto do constituinte ou dos defensores do equilíbrio entre os poderes. Na verdade, tal situação pode nos remeter aos primórdios das discussões acerca da existência de um guardião da Constituição. Ao longo da década de 1930, assistimos ao debate de dois doutrinadores estrangeiros, Carl Schmitt e Hans Kelsen, sobre o tema. O primeiro, figura controversa e simpático às ideias autoritárias que se difundiam na Europa de então, advogou pela tese de que, em última instância, em casos limítrofes, a palavra final acerca dos temas constitucionais deveria ser de um soberano, representado na figura do C hefe do Poder Executivo.

Já o segundo, Hans Kelsen, por sua vez, acreditava que tal desenho poderia resultar em um autoritarismo ilimitado, uma vez que o Executivo é um poder intrinsecamente político, compromissado com sua parcialidade e perpetuidade. Ele acreditava que esse acúmulo de poder poderia resultar até mesmo no aniquilamento daquilo que se diferenciasse do dominante. É por isso que este autor defendia que a função de guardião da Constituição deveria ser atribuída, ao menos majoritariamente, a uma Corte. Sua argumentação prevaleceu e é esse o desenho que tradicionalmente se consolidou nos países democráticos.< /span>

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É nessa toada que nossa Constituição, notoriamente em seu artigo 102, elencou as atribuições do Supremo Tribunal Federal, classificando-o como seu principal intérprete. A ideia de um poder independente é tão latente que aos seus componentes é concedido um mandato vitalício, visando a afastar seus representantes das pressões populares. Isso não pode ser confundido com a ideia de um STF livre para atropelar a letra constitucional, muitas vezes, sob o disfarce de uma “função iluminista”, termo utilizado por alguns. Não, seu caráter técnico deve ser preservado. Não é, no entanto, o que se tem observado: a e vocação do fenômeno da mutação constitucional, respaldando decisões muitas vezes mais populistas e políticas do que fiéis ao espírito da lei é constante. Isso se agrava ainda mais quando temos em visão o acúmulo de matérias ao cargo desse tribunal, decorrente da amplitude de temas concernentes à nossa Constituição.

A cada vaga que surge no STF, o candidato indicado enfrenta dois questionamentos: o primeiro, referente ao caráter político que muitas vezes permeia sua seleção; o segundo, quanto ao seu notório saber jurídico. No entanto, perde-se de vista uma leitura mais ampla do fato concreto. A análise deveria focar não na competência do indicado, mas sim em um problema sistêmico em nossa Corte. Diante de tal hipertrofia, decorrente de um acúmulo exagerado de competências, não seria caso de se questionar a cada indicado sua aptidão, mas de se levantar uma outra pergunta: haveria, em nossa República, ser humano capaz de lidar com tamanho poder.

Laura Gandra Laudares Fonseca é advogada, mestranda em direito Constitucional pela UFMG, instituição na qual obteve o grau de bacharel. É especialista em Direito Constitucional pelo Instituto Ives Gandra

Guilherme Gandra Martins
Graduando em direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e especialização em Filosofia do Direito pelo Instituto Ives Gandra

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