Saúde
Novos comportamentos pós-pandemia e o futuro da saúde
A pandemia não acabou. E entender seus desdobramentos e o que esperar de próximas crises de saúde pública que rondam o planeta talvez seja um dos assuntos que mais nos angustiam na atualidade. Em meio a muito mais dúvidas do que certezas, a ciência – ainda bem – ganhou espaço.
Nos últimos dois anos e meio, nós, que acompanhávamos apreensivos o noticiário, encontramos na cientista Natalia Pasternak, por tantas vezes, clareza e um alento: além de explicar o que estava em curso e os estudos em andamento, ela deu voz à indignação em face da demora nas medidas de isolamento efetivo, da tardia compra de vacinas e foi uma incansável combatente das fake news que insistiam (e ainda teimam) em bater cartão nos debates.
Referência no combate à desinformação
Em 2020, ela se tornou a primeira brasileira a integrar o Comitê para Investigação Cética (CSI, na sigla em inglês), instituição criada nos EUA, em 1976, para apurar e esclarecer alegações que negam a ciência. No mesmo ano, a cientista recebeu o Prêmio Ockham de Ativismo Cético, promovido pela The Skeptic, como reconhecimento à sua importância no combate à desinformação. E todo esse caminhar fez dela um dos destaques da conferência Fronteiras do Pensamento deste ano, que aconteceu entre agosto e novembro, com 12 importantes debates sobre o nosso futuro, especialmente conectado à tecnologia.
Natalia é formada em Ciências Biológicas pelo Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (IB-USP) e tem PhD com pós-doutorado em Microbiologia, na área de Genética Molecular de Bactérias pelo Instituto de Ciências Biomédicas da mesma universidade (ICB-USP). À Vida Simples, Natalia Pasternak falou sobre o futuro da saúde, como podemos nos preparar para o que está por vir e sobre a importância de ter a ciência no centro de debates sociais e políticos.
O que esperar do futuro no âmbito da saúde?
A gente está entrando em uma época da história do planeta – o Antropoceno – dominada pela espécie humana, que influencia diretamente as atividades do nosso mundo. Estamos interferindo em relações ecológicas, com o desmatamento, o aquecimento global e a agricultura predatória. E, com isso, espécies mudam de lugar, e entramos em contato com animais com os quais não nos relacionávamos antes.
Essa interação, inclusive entre as pessoas, por conta da globalização, leva a uma possível troca de patógenos e gera maior probabilidade de doenças emergentes. Precisamos, urgentemente, encontrar uma maneira mais sustentável de explorar os recursos do planeta. Melhorar nossos sistemas de saneamento, de vigilância genômica e de comunicação de doenças.
Ainda dá tempo de revertermos esse quadro?
Correndo o risco de ser pessimista, de acordo com um trabalho recente feito com modelagem matemática sobre interações entre espécies de mamíferos para verificar trocas de vírus, já estamos vivendo esse momento. Já tivemos um aquecimento de 1,2 grau centígrado no planeta, o deslocamento de espécies… É preciso agir agora, já estamos atrasados.
Como podemos nos preparar para novas doenças e surtos, causados por essa intensa degradação do planeta?
Como pessoas, acredito que precisaremos ter uma etiqueta respiratória, pensando que o mundo é muito globalizado, com densidade demográfica altíssima e doenças respiratórias se espalham facilmente. Neste sentido, se estou com algum sintoma, tossindo, nariz escorrendo, vou usar máscara para sair na rua. Levar álcool em gel sempre na bolsa, no transporte público.
Não ir trabalhar com sintoma respiratório num escritório com pouca ventilação. São hábitos que terão que ficar corriqueiros. Mesmo sem a COVID, isso precisará se manter. Mas não podemos jogar toda a responsabilidade de cuidado sobre o cidadão. Há estratégias de políticas públicas que precisam acontecer, como já mencionei, sistemas de controle e comunicação que precisam ser melhorados. A população precisa de instrução e boa comunicação dos governos.
E a pandemia de Covid-19? Vamos vê-la acabar algum dia?
O estado pandêmico vai acabar. Nenhuma doença dura como pandemia para sempre. Mas como a COVID vai se transformar, a gente não sabe. Só vamos saber olhando para trás, daqui a alguns anos, observando o último pico. Só aí saberemos se a doença apresentará surtos sazonais, se terá se tornado endêmica em regiões não vacinadas. Mas é difícil prever. O que sabemos é que pandemias não duram para sempre, elas acabam.
O que precisamos aprender tendo em vista os impactos e perdas que ainda estamos enfrentando?
De uma próxima vez, precisamos preparar uma resposta mais rápida. O período longo de isolamento poderia ter sido encurtado por um serviço melhor de comunicação, vacinas compradas e aplicadas antes, um bom isolamento, feito de verdade, logo no começo… Os aprendizados que ficam são esses.
Qual o caminho para o combate às fake news, que influenciaram negativamente no enfrentamento à pandemia?
O acesso à informação é tão fácil que as notícias falsas sempre precisarão ser combatidas. Vejo que o único caminho é investir pesadamente em educação científica, para que as novas gerações não sejam tão facilmente enganadas. É preciso mudar a maneira como a gente ensina ciências nas escolas, no Brasil e no mundo. Hoje falamos de ciência às crianças e jovens de uma maneira conteudista, apresentando o que está certo e o que está errado.
A gente não ensina como as descobertas foram feitas, quais foram os experimentos que nos levaram a essa ou àquela conclusão. Ensinar ciência dessa maneira, como prato feito pronto, e não como um processo de investigação, criará adultos que cobram respostas prontas, o sim ou não, como era pedido na prova. A ciência é baseada no que não sabemos, no que estamos investigando, em incertezas. Precisamos ensinar as crianças e jovens a pensar, ter pensamento crítico.
Texto originalmente publicado na revista Vida Simples (Edição 246)
Por Nathália Duarte
Fonte: IG SAÚDE
Saúde
Especialistas se reúnem em workshop para discutir estratégias e inovações para impulsionar a economia de baixo carbono e a redução de emissões de gases de efeito estufa no Brasil
A redução da emissão de gases poluentes é uma demanda mundial urgente para desacelerar o processo de aquecimento global. O impacto das mudanças climáticas, com a recorrência de eventos extremos como verões mais quentes, períodos de secas e chuvas mais concentradas e intensas, impulsiona a transição para uma economia de baixo carbono.
Para estimular a troca de experiências e conhecimentos sobre o assunto, o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Minas Gerais (Crea-MG) promove, no dia 22 de outubro de 2024, o workshop “O papel das engenharias na transição para uma economia de baixo carbono”. O evento, gratuito e aberto ao público, reúne especialistas para debater soluções integradas para a redução de emissões de carbono e da sustentabilidade em diversos setores como indústria, transporte, construção civil, energia e agronegócio.
O papel da engenharia
Organizado pelo Grupo de Trabalho (GT) “Economia de Baixo Carbono”, o workshop apresentou novas perspectivas para o mercado de carbono brasileiro e abordou a criação do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE) por meio do Projeto de Lei 182 de 2024, em análise no Senado.
“Precisamos ampliar a discussão sobre esse mercado e o papel das engenharias na desaceleração das mudanças climáticas”, pontuou a coordenadora do GT, engenheira mecânica Sírcia de Sousa.
Segundo ela, que também é conselheira da Câmara Especializada de Engenharia Mecânica, a engenharia é essencial para o planejamento e implementação de estratégias de descarbonização para setores industriais, monitoramento e verificação de gases de efeito estufa, além da criação de soluções baseadas na natureza para remoção de carbono. “Os engenheiros também desempenham um papel essencial na produção de normas que orientam e incentivam a população a ter atitudes menos agressivas ao meio ambiente, além de tornar atrativa a adesão da sociedade a um cotidiano de menor emissão de gases poluentes”, ressalta Sírcia.
O engenheiro florestal e técnico administrativo da Ufla, Thiago Magalhães Meirele, destacou a importância de ambientes como o workshop organizado pelo Crea-MG para que profissionais de diversas áreas possam interagir, debater e criar soluções mais ágeis para que o processo de migração do mercado para a economia de baixo carbono seja mais eficiente. “Esse processo é multidisciplinar, cada profissional dentro da sua área, da sua especificidade e atribuição técnica tem seu papel. Juntos, eles vão ajudar na criação de novas tecnologias, no desenvolvimento de protocolos, na aplicação de certificações, dentre outras questões”, disse. Thiago ainda destacou que é preciso que toda a população tenha consciência do tema. “Esses são problemas coletivos e só podem ser resolvidos na coletividade, se não houver um entendimento de que todas as áreas precisam trabalhar juntas para atingir essas metas, a gente não vai conseguir alcançá-las”, afirmou. O engenheiro concluiu explicando a importância do poder público nesse contexto. “Esse processo perpassa também por mudanças de políticas públicas, por incentivos fiscais, por educação”.
Também reconhecendo a iniciativa do Crea-MG em promover um evento para debater um tema “muito importante e de interesse mundial”, o engenheiro florestal Enio Fonseca, com 42 anos de atuação nas áreas de sustentabilidade, meio ambiente e mineração, ele veio participar do workshop. Fonseca parabenizou o Conselho e relembrou que “a engenharia tem um papel muito importante na dinâmica da concepção e operacionalização dessas questões da transição energética e que envolvem o crédito de carbono’’
Exemplo mineiro
Durante o workshop o município do sul de Minas, Extrema, ganhou espaço por ser o pioneiro e ser exemplo em relação a implementação de políticas ambientais. “O primeiro o município que tem esse tipo de modelo de mercado regulado de carbono é mineiro. Extrema é um caso de sucesso que começou em 2005 com uma política de pagamento dos serviços ambientais e na evolução da política, entre 2015 e 2017, eles começaram a incorporar a questão do carbono como uma das condicionantes ambientais”, comentou a engenheira florestal Valéria de Fátima Silva, integrante da Carbon Flore, empresa dedicada a soluções para economia de baixo carbono.
Valéria explicou que em nível estadual e nacional, a regulação caminha lentamente e que ainda existem diversos entraves para que o mercado adote políticas ambientais.
“Para avançar, é preciso haver consenso e envolvimento, e Extrema se diferenciou por fazer esse envolvimento voluntariamente, então só quando as empresas passaram a apoiar o projeto voluntariamente, eles instituíram isso como lei. Então o caminho foi primeiro de convencimento, de engajamento voluntário, para depois a obrigação legal”, explicou a engenheira florestal.
Outro desafio apontado pelo engenheiro de produção civil e professor do Cefet-MG Augusto César da Silva Bezerra é a ampliação do uso de biomassa para a produção de energia. Para ele, o mercado de uma maneira geral está atento ao uso consciente da energia. “A indústria global tem uma projeção de emissões mais voltada para o setor energético, para a energia, o uso da energia na indústria. E a indústria brasileira, nesse aspecto, está bem. A energia brasileira é uma energia mais limpa do que a média global. Nosso principal desafio, eu acredito que seja a gente conseguir potencializar o uso de biomassa, seja para a produção de energia térmica, de biocombustíveis ou de bioenergia, de uma forma ampla”, afirmou.